Melhores cristais e culturas de células 3D:
Como a microgravidade ajuda na descoberta e eficácia de medicamentos

A cultura de células sob as condições de microgravidade do espaço permite aos investigadores compreender a forma como o stress da microgravidade afeta as células, desde alterações na expressão genética à automontagem de estruturas 3D destinadas a modelos de doenças.

Quando ouvimos falar em investigação sobre microgravidade, pensamos sobretudo na saúde dos astronautas e na sobrevivência numa viagem a Marte.

No entanto, os efeitos da microgravidade podem ter um impacto fortemente positivo sobre as indústrias aqui na Terra, especialmente no que diz respeito às indústrias farmacêutica e biotecnológica.

A investigação em Ciências da Vida é uma área muito desenvolvida dentro do sector da investigação sobre microgravidade no espaço, como é evidenciado através da preponderância dos 30 anos de investigação financiada a nível federal pela NASA e ESA (Estação Espacial Europeia), na era do vaivém e com apoio da ISS (Estação Espacial Internacional). Esta irá continuar, uma vez que vemos empresas farmacêuticas, biotecnológicas e de dispositivos médicos utilizam a Órbita Terrestre Baixa (“Low Earth Orbit”) para desenvolver medicamentos, melhorar procedimentos de produção de resultados, otimizar processos de fabrico, cultivar tecido humano para testes de medicamentos mais precisos, e cultivar tecidos para uma mais apurada modelação de doenças.

Neste breve artigo, vamos explicar os benefícios em duas áreas principais: culturas de células e crescimento de cristais de proteínas:

Culturas de células

A cultura de células sob as condições de microgravidade do espaço permite aos investigadores compreender a forma como o stress da microgravidade afeta as células, desde alterações na expressão genética à automontagem de estruturas 3D destinadas a modelos de doenças. A utilização da cultura de células é a base para muitas experiências em microgravidade, e até a simples compreensão das diferenças básicas entre a expressão genética das células cultivadas em microgravidade e aquelas que são cultivadas na gravidade da Terra pode levar a avanços na compreensão da saúde humana e das doenças.

Desenvolvimento de medicamentos: As células humanas produzem modelos de doenças humanas e de reações a medicamentos muito melhores do que os modelos animais, e as células crescem no espaço de uma forma mais semelhante aos órgãos no corpo humano real.

Modelação de doenças: Foi demonstrado que o espaço provoca perda muscular, diminuição da densidade óssea, e senescência celular – podendo tudo isto ser comparado aos efeitos do envelhecimento na Terra. A cultura de células em microgravidade permite estudos de perda muscular, diminuição da densidade óssea, e do processo de senescência celular em microgravidade, durante semanas, meses, e possivelmente anos, para comparação com o que se passa na Terra. Se as células envelhecem mais rapidamente em microgravidade do que na Terra, quando cultivadas in vitro, isso pode conduzir a uma compreensão a longo prazo das formas de combater o envelhecimento celular.

Crescimento de cristais

O crescimento de cristais em Microgravidade está a ser impulsionado pelas condições de microgravidade na Estação Espacial Internacional. Para coisas materiais como macromoléculas, a ausência de gravidade pode beneficiar reações químicas e processos físicos tais como o crescimento de cristais, graças à redução do escoamento turbulento e/ou ao abrandamento da velocidade de nucleação, agregação, e formação de cristais. Destas alterações, pode resultar a formação de cristais fisicamente maiores e mais homogéneos que, por sua vez, podem ser visualmente inspecionados na Terra para gerar imagens de maior resolução da estrutura física da macromolécula. Os cristais que crescem em microgravidade são de grande interesse para as grandes empresas farmacêuticas e biotecnológicas que atuam na Terra. Melhores cristais ajudam no desenvolvimento e reformulação de medicamentos destinados a intervenções farmacológicas e benefícios biológicos. A microgravidade viabiliza melhores mapeamentos de macromoléculas e/ou dos seus alvos terapêuticos, com o intuito de prevenir, tratar, ou curar doenças, graças aos cristais maiores e mais ordenados produzidos num ambiente de microgravidade.

Só por si, estes dois efeitos já conduziram a inúmeras experiências na ISS, por parte de empresas comerciais, como a Merck, GlaxoSmithKline, Eli Lilly ou Bristol-Myers Squibb. A Merck até já melhorou o seu bem-sucedido medicamento contra o cancro Keytruda, graças à investigação de microgravidade. É de esperar com expectativa os próximos avanços derivados da investigação no ambiente único da microgravidade.

 

[A Agência Espacial Portuguesa, Espaço Portugal está a organizar um workshop online com o objectivo de promover a utilização do futuro veículo orbital da ESA, Space Rider, entre o ecossistema industrial e científico português. O registo é gratuito].
Autor
Mark Kugel
Data
19 de Janeiro, 2021
Sobre o autor

Mark Kugel é o cofundador e Diretor Comercial da YURI, empresa espacial alemã que viabiliza actividades de Investigação & Desenvolvimento em microgravidade de forma eficiente e financeiramente acessível para todos os interessados. Usando um serviço “de chave na mão” amigo do utilizador e bioreactores reutilizáveis, a empresa pode encetar uma experiência com a ISS em menos de 6 meses e por menos de 100.000 euros. Os projetos em desenvolvimento incluem células cancerígenas, células estaminais neurais e cristais de proteínas. Para saber mais acerca da YURI visite www.yurigravity.com