Nova missão Copernicus fornece dados gratuitos sobre 95% do oceano

O novo Sentinel 6 Michael Freilich será decisivo na tomada de decisão sobre medidas de adaptação face às consequências das alterações climáticas, ajudando a proteger os cerca de 600 milhões de pessoas que vivem em áreas costeiras vulneráveis.

O Copernicus Sentinel-6 nas instalações da IABG em Ottobrunn (Alemanha), antes de ser testado e preparado para lançamento a 21 de novembro, a partir da Base da Força Aérea de Vandenberg, Califórnia (EUA).

Os altímetros radar proporcionam a aquisição de informação acerca de diferentes características da superfície do oceano, sendo esta informação útil, também, na compreensão dos diferentes fenómenos e processos que ocorrem em profundidade, aos quais as características de superfície estão, de alguma forma, ligadas. A altimetria por satélite permite, desta forma, uma estimação 4D do estado do oceano, tendo vindo a impor-se, ao longo dos anos, como um contributo valioso para o conhecimento do mesmo.

Após o lançamento da missão TOPEX/Poseidon (T/P) em 1992, talvez a mais famosa missão de altimetria por satélite, várias outras foram lançadas com um altímetro radar a bordo. Os objetivos principais desta missão conjunta da NASA e do CNES prendiam-se essencialmente com o estudo da topografia oceânica, da variabilidade oceânica e do nível do mar à escala global. Seguiram-se as missões Jason-1 (2002-2013), Jason-2 (2008-2019) e Jason-3 (2016-presente) com características semelhantes às da missão T/P (1992-2005). Esta série de missões altimétricas, dado o seu período de repetição (~10 dias) e a precisão inigualável das suas medidas, é considerada a série de referência para o estudo do nível do mar e da sua variação. A extensão desta série temporal até 2030 é agora possível com a missão sucessora Sentinel-6, parte do programa europeu de Observação da Terra Copernicus e que resulta de um esforço conjunto entre a EUMETSAT, a CE, a ESA, a NASA e a NOAA, permitindo, com os seus dois satélites (o lançamento do Sentinel-6B está previsto para 2025), completar quatro décadas de dados fundamentais para o estudo da climatologia terrestre.

A missão altimétrica Sentinel-6 terá início já no próximo dia 21 de novembro com o lançamento do satélite Sentinel-6 Michael Freilich, permitindo dar continuidade a três décadas de observação do nível do mar.

A informação adquirida pelas missões altimétricas, ao longo destas décadas, tem permitido caracterizar as correntes oceânicas de superfície e a sua variabilidade, o campo de ondas oceânicas, o nível médio do mar e a sua variação, a forma da Terra (geoide) e as anomalias gravimétricas da superfície terrestre, a intensidade do vento junto à superfície do mar, as marés oceânicas, a cartografia das calotes polares e do fundo marinho, tendo ainda contribuído para o desenvolvimento de modelos numéricos de circulação oceânica.

Estando a circulação do oceano diretamente relacionada com a redistribuição de energia no sistema climático e, portanto, com as alterações que este sofre, as observações de altimetria por satélite são críticas para compreender o clima e prever a sua variabilidade. Como exemplo, destaca-se a previsão, análise e monitorização de fenómenos responsáveis por alterações significativas no clima a nível global e regional e que possuem expressão clara no nível do mar, como o El Niño Southern Oscillation, que induz chuvas excessivas, secas extremas e, por consequência, incêndios catastróficos. Não menos importante é a previsão da rota de eventos meteorológicos extremos como os furacões, permitindo mitigar as suas consequências ao atingirem ilhas e zonas costeiras. Esta informação possui, portanto, relevância máxima não só para a comunidade científica, como também para a sociedade em geral.

Além de permitir os estudos acima referidos, a missão Sentinel-6 fornecerá informação em tempo quase real para aplicações marítimas e meteorológicas, sendo também fundamental para a oceanografia operacional. Além de garantir o legado das missões de referência e a continuidade da missão Jason-3, ainda operacional, a missão levará a bordo instrumentos de última geração, que recolherão observações mais precisas e com uma resolução espacial mais elevada. Espera-se, assim, a cobertura das zonas mais próximas da costa, bem como dos corpos de água no interior dos continentes (rios e lagos).

A missão adquirirá dados cruciais para o estudo do clima, fornecendo informação chave para a tomada de decisão relativamente às medidas de adaptação necessárias para fazer face às consequências das alterações climáticas, ajudando a proteger os cerca de 600 milhões de pessoas que vivem em áreas costeiras vulneráveis. À semelhança do que acontece com as outras missões Copernicus, como por exemplo a missão Sentinel-3 operada pela ESA e pela EUMETSAT, já em fase operacional, os dados da missão Sentinel-6 estarão acessíveis de forma gratuita e cobrirão cerca de 95% do oceano.

Autor
Clara Lázaro
Data
21 de Novembro, 2020
Sobre o autor

Clara Lázaro é professora auxiliar na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP). Doutorada em Engenharia Geográfica pela FCUP, especializou-se em Altimetria por Satélite aplicada ao estudo do oceano. Actualmente, a sua investigação centra-se no estudo da variação do nível do mar usando Altimetria por Satélite e no desenvolvimento de metodologias para o cálculo de uma correcção melhorada para contabilizar o efeito da componente húmida da troposfera nas medidas de Altimetria por Satélite nas zonas costeiras. Clara Lázaro tem estado envolvida em vários projectos de investigação nacionais e internacionais