Artemis I – De regresso à lua… para ficar

Portugal contribui com diferentes elementos para a missão Artemis. Relativamente à Artemis I, a Active Space Technologies contribuiu para o Orion MPCV com Structural Thermal Models (STM) para as baterias e a Amorim Cork Composites forneceu cortiça como isolamento térmico para o SLS.

Se perguntar a qualquer pessoa no mundo quem é o astronauta mais conhecido de todos os tempos, eles responderão Neil Armstrong ou Yuri Gagarin. Mas as conquistas destes astronautas, que ficaram colectivamente gravadas na história e nas nossas mentes, aconteceram há mais de meio século, quando os  telefones celulares ainda nem existiam. Desde então, apenas 12 pessoas caminharam na superfície da Lua, todas elas homens, todas cidadãos dos EUA, e isso foi há 50 anos. 

Que fizemos desde então? Explorámos o sistema solar e mais além, aterrámos com sondas e veículos em Vénus, Marte e outros corpos celestiais, construímos estações espaciais, desenvolvemos a comunicação por satélite, o Sistema Global de Navegação por Satélite (GNSS), e usámos satélites para recolher dados científicos e promover a consciência de que temos de proteger o nosso planeta em risco… mas nenhum ser humano voltou a aventurar-se mais do que umas centenas de quilómetros da Terra. 

No entanto, isso está prestes a mudar. A tecnologia está a avançar rapidamente, o espaço já não é o campo de uma corrida entre os governos dos EUA e USSR, há muitas outras regiões que querem explorá-lo e obter benefícios com isso, como a China, Europa, EAU, ou Japão, entre outras, assim como empresas particulares que também aspiram ao mesmo e têm os meios tecnológicos e financeiros para o fazer! 

Mas qual é a próxima grande meta na exploração espacial humana? Alguns países querem aterrar ou pisar na Lua pela primeira vez, outros querem enviar a primeira mulher à Lua, mas algo mudou nestes planos: em vez de ir à Lua para uma missão rápida, fazer algum trabalho científico e “plantar uma bandeira”, desta vez queremos ir lá, conhecer mais sobre ela, explorá-la e utilizar os seus recursos; desta vez queremos ir lá e ficar, é essa a diferença. E tudo isto com o horizonte de perspectiva de algures no futuro enviar humanos a Marte. Esta é a visão do Programa Artemis.  

O nome Artemis é o da Deusa Grega da Lua, irmã gémea de Apollo, dando-nos uma pista sobre a ambição do programa. Artemis consistirá numa série de missões progressivamente mais complexas que terão como objectivo colocar humanos na Lua e no seu redor, e no futuro estabelecer uma base semi-permanente na sua superfície para aprofundarmos o nosso conhecimento sobre o universo; servirá para testarmos novas tecnologias mas também para melhorarmos a nossa compreensão sobre o comportamento do corpo humano em ambiente de espaço profundo – tudo isto são passos fundamentais para um dia enviarmos humanos a Marte em segurança. 

Artemis dependerá do foguete do Sistema de Lançamento Espacial (SLS) e da nave espacial Orion (incluindo o Modulo de Serviço Europeu – ESM), assim como de outros equipamentos de lançamento e aterragem comerciais e institucionais; dependerá também da Lunar Gateway, a estação espacial que está a ser desenvolvida em colaboração internacional e que fará a órbita da Lua numa Orbita de Halo Quase Retilíneo (NRHO). 

O calendário planeado para os primeiros 5 voos é o seguinte: 

  • Artemis I: Verão 2022 — Sobrevoo da Lua com a nave Orion sem tripulação e com alguns nanossatélites. 
  • Artemis II: 2024 — Sobrevoo da Lua com a nave Orion tripulada. 
  • Artemis III: 2025 — Aterrar na Lua. 
  • Artemis IV: 2027 — Entrega do Modulo Habitacional Internacional (I-HAB) à estação Lunar Gateway. 
  • Artemis V: 2028 — Entrega do Sistema Europeu de Fornecimento de Reabastecimento, Infraestruturas e Transmissões (ESPRIT) à estação Lunar Gateway. 

 

Estas missões serão complementadas por outras que estão à responsabilidade de entidades comerciais como a SpaceX que lançará os elementos iniciais da estação Lunar Gateway (PPE+HALO) em 2024, ou o teste do Sistema de Aterragem Humano (HLS) por essa mesma empresa, assim como outras missões relacionadas com telecomunicações e navegação. 

No entanto, há uma grande diferença entre os programas Artemis e Apollo. Enquanto Apollo foi uma iniciativa exclusivamente dos EUA, o Artemis é um projeto internacional liderado pelos EUA para o qual contribuem  e beneficiarão dele muitos países. No que diz respeito à Europa, a sua contribuição ao Programa Artemis é muito significativa: a Agência Espacial Europeia (ESA) está a contribuir com o Módulo de Serviço Europeu para todos os voos Orion, e com o I-HAB e Esprit para a estação Lunar Gateway, assim como, eventualmente, um sistema de Comunicações e Navegações Lunares, o Sistema Aterragem Europeu (EL3) e outros elementos. Em troca, a Europa vai poder desenvolver investigação abordo da estação Lunar Gateway e eventualmente, algures no futuro, enviar europeus à Lua.  Portugal contribui com diferentes elementos para a missão Artemis. Relativamente à Artemis I, a Active Space Technologies contribuiu para o Orion MPCV com Structural Thermal Models (STM) para as baterias e a Amorim Cork Composites forneceu cortiça como isolamento térmico para o SLS.

Quanto à Artemis I, a missão será lançada da base 39B do Centro Espacial John F. Kennedy, e será o primeiro teste de voo integrado da nave Orion da NASA e do foguete de Sistema de Lançamento Espacial (SLS). Esta missão vai colocar a cápsula Orion numa Orbita Retrograda Distante (DRO) em redor da Lua (uma orbita estável específica até agora apenas conseguida pela nave chinesa Chang’e) e também lançará uma série de nanossatélites enviados por parceiros internacionais. 

 

 Figura 1. O voo projectado de Artemis I – Referência: Nasa (2019) 

 

Finalmente, é importante apontar que o Programa Artemis não é uma iniciativa única; outros países como a Rússia, China, Coreia do Sul, Japão, Israel e muitos outros também têm planos de chegar aos corpos celestiais mais próximos da Terra durante os próximos anos. Por exemplo, apenas há uns dias, a Coreia do Sul lançou a sua sonda KPLO (Korea Pathfinder Lunar Orbiter), a primeira missão desse país à Lua. 

Para resumir, fomos à Lua há 50 anos, e quase não regressámos lá desde então. No entanto, o futuro parece promissor para a Exploração Lunar e a próxima década será uma em que provavelmente muitos países visitarão e explorarão este nosso satélite natural, humanos voltarão a caminhar na sua superfície, e construiremos uma estação espacial na sua órbita e uma base no seu solo. Enfim, a próxima década será certamente a década da Lua! 

Autor
Joan Alabart
Data
29 de Agosto, 2022
Sobre o autor

Joan Alabart tem um mestrado em Engenharia Civil pela Universitat Politécnica de Catalunya, Espanha. Nascido e criado na Catalunha, passou um ano na holandesa TU Delft num programa de intercâmbio. Joan tem mais de cinco anos de experiência em engenharia e gestão de projetos em grandes obras internacionais (ferroviária, rodoviária, marítima), que combina com uma longa paixão pelo Espaço. Este entusiasmo pela última fronteira, juntamente com uma ligação pessoal a Portugal, trouxeram-no para Lisboa, onde trabalha atualmente como Gestor de Relações e Projetos Industriais na Agência Espacial Portuguesa, com foco em aplicações não-espaciais. Quando não está a falar dos prodígios do Espaço nos traz, é provável que o encontre a andar ao longo do Tejo na sua reluzente bicicleta cor de laranja.